Criei este blog há um ano. Pretende ser um diário sincero, aberto, sobre o cotidiano de uma pessoa que sofre de depressão.
Um pequeno problema: quem sofre de depressão não tem a energia necessária para manter uma atividade diária “obrigatória” caso não seja levada a isso por força maior.
Uma companheira de sofrimento me falou algo muito sábio. Você pode lidar com tudo nesta vida, só não consegue lutar contra a depressão. Por quê, pergunta você? Porque ela mina toda sua energia.
Você que me lê já passou três semanas na cama? Eu, já. Queria muito me levantar e curtir a vida, tomar sol, fazer exercícios. Muito mesmo. Só que não havia uma gota de energia no meu organismo.
Hoje, por exemplo. Só consegui me levantar às 15h. Isso mesmo. Não comi, não tomei água, não fui ao banheiro.
Em geral, sinto-me melhor no final da tarde. Aí tomei banho e vim trabalhar um pouco. Fazia uma semana que não conseguia trabalhar.
Preguiçosa, dizem os ignorantes. Mole, lesma, lerda, só gosta de cama. É assim que muitos me veem. Deus me deu a bênção de não me importar com a opinião alheia, tanto que estou aqui escrevendo isso.
Sou tradutora, amo minha profissão. No entanto, estou com um trabalho atrasado há meses, trabalho interessante, que me empolga. O que faço? Fico ali deitada, chorando porque não consigo me sentar aqui à mesa e atacar a tradução que quero tanto concluir.
Tenho dois diagnósticos: depressão maior grave, extremamente resistente ao tratamento. O outro: depressão crônica.
Sabe o que isso significa? Dor, sofrimento, lágrimas – muitas, infindas – vontades insatisfeitas, incompreensão por parte dos que convivem comigo, apatia, desejo de morrer. Não, não planejei nada. Mas ficaria bem feliz de deixar este mundo tenebroso.
Já pensou no meu dia de hoje? Moro numa casa deliciosa, tenho piscina. Se tivesse forças, teria feito o que planejei ontem: levantar, ir fazer yoga à beira da piscina e depois nadar um pouco. Molhar minhas orquídeas e suculentas. Sim, sei que teria feito muito bem. Amanhã de manhã será que você poderia vir aqui em casa e tirar a placa de concreto que pesa toneladas e fica em cima de mim me prendendo à cama? Depois de tirar a placa você pode, por favor, me colocar em pé, pôr algum alimento em minha boca, me levar ao banheiro? Também arrume minha cama e abra as janelas, assim, quando eu voltar ao quarto, ele não estará escuro, não será a caverna em que me enfiei hoje.
Se você fizer isso, garanto que nunca mais criticará uma vítima de depressão. Verá, com seus próprios olhos, como é difícil para quem não tem energia encontrá-la em algum lugar.
O que eu quero fazer amanhã? Ir ao médico, ao psiquiatra. O dia marcado foi semana passada, não consegui. Será que você pode vir aqui em casa e, depois de fazer tudo aquilo ali em cima, me levar até lá, depois até uma agência da Caixa Econômica, passar em um verdurão para fazer umas comprinhas e depois me trazer de volta para casa? Como eu sei que você não vem, vou me deitar, na esperança de encontrar alguma energia escondida e, pelo menos, ir ao médico.
Ah, hoje eu tomei banho. Não é todo dia que consigo. Algum deprimido já te contou isso? Muitos de nós ficamos dias sem tomar banho. Só quem vive a depressão sabe quanta energia um simples banho extrai da pouca reserva que possuímos…
Boa noite para você, porque eu nunca sei se vou conseguir dormir, apesar de tomar remédio todas as noites. Ontem só consegui dormir hoje às 4h da manhã… E aí ouço: você precisa mudar sua rotina. Dá vontade de pendurar a pessoa de cabeça pra baixo e gritar no ouvido até ela não aguentar mais: “ISSO É O QUE EU MAIS QUERO. SIMPLESMENTE, A DOENÇA NÃO DEIXA”. O fato triste é que poucos acreditam em nós.
Meu nome, Cláudia, significa “aquela que manca”. Eu falo que gostaria de mancar. Quem sabe uma perna bem mais curta do que a outra. Todos me ajudariam, me dariam a mão, entenderiam dor nas costas, ninguém me pediria para correr, para fazer nada que estivesse além da minha capacidade física. Ah, mas a depressão é malvada. Por fora, não existe nada. Nenhum sinal. Só manco por dentro. Só eu sei como dói esse meu defeito de nascença.
Bem, por hoje é isso. Ah, se você vier aqui me ajudar amanhã, não adianta tocar o interfone. Eu não consigo me levantar para atender. Pede para alguém abrir o portão. Pode entrar em casa e começar a trabalhar. Vou apreciar muito sua ajuda.
E tomara que amanhã eu venha até aqui te contar como foi o dia. Eu quero. Se não vier, não fique brav@. Não terá sido falta de vontade, terá sido ausência de forças.